Quando Marcos Roberto da Silva, 52, começou o projeto do filme “Posse Hausa — A Flor do Baobá” , ele tinha como um dos objetivos apresentar o curta nas escolas e ajudar em algo que enfrentou quando estudava.
“Já sofri muito racismo e sei como esse tipo de violência é um divisor de águas para o aluno decidir ou não prosseguir nos estudos”, afirma o artista que é morador de São Bernardo do Campo, na Grande São Paulo.
Conhecido como Black Alquimista, ele lançou o primeiro curta-metragem da carreira em 27 de junho, no Teatro Elis Regina, em São Bernardo do Campo, com o auxílio da Lei Paulo Gustavo.
Black diretor do filme e o protagonista Marcos Bernardo que foi prestigiado na estreia do curta ‘A Flor de Baobá’ @Daniela Ferreira/Agência Mural
Posse Hausa é um documentário híbrido que mistura realidade com ficção. A narrativa acompanha um adolescente de 14 anos que começa a estudar a Revolta do Malês, em 1835, em Salvador, na Bahia, e o coletivo Posse Hausa, do qual é um dos criadores no ABC Paulista.
O filme também conta com entrevistas com outros fundadores da organização. A obra é uma novidade depois de uma carreira longa como produtor musical, MC, beatmaker e sonoplasta.
Carreira musical
Com um jeito calmo e comunicativo, Black recebeu a Agência Mural em seu estúdio para a entrevista. Logo ao chegar, é possível ver um mural com a palavra “oráculo” e diferentes quadros de figuras importantes para a história negra, espalhados pelas paredes da sala.
Antes de começarmos a conversa, o diretor fez questão de mostrar a vista da região. No andar de cima, era possível ter uma visão de diferentes periferias da cidade, como a Vila São Bernardo e a Vila São Pedro.
A ligação entre Black e arte começou ainda quando ele era criança. O avô materno dele era músico autodidata, e o pai tocava viola. Black relembra que passou grande parte da infância ouvindo os discos de música caipira do pai. O patriarca tinha o hábito de sempre comprar novos discos na volta do trabalho.
“Cresci ouvindo músicas de moda de viola e MPB. E depois, quando eu me tornei compositor, percebi o quanto essas canções me influenciaram a escrever músicas que também eram histórias sobre a realidade que eu vivia”, conta o artista.
O ano de 1983 foi decisivo na vida do MC. Michael Jackson havia lançado a música Billie Jean e os grupos de breakdance estavam se tornando cada vez mais populares no Brasil. O diretor relembra como esses eventos foram importantes para o começo dele na música.
“O disco que mudou a minha vida”, diz apontando para a capa do vinil de Billie Jean. “Lembro que, na época, o meu professor de educação artística disse que quem dançasse igual ao Michael Jackson ganharia nota na aula. E isso me animou, porque eu e os meus amigos já estávamos dançando… Me conectei com a música através da dança”, fala o músico.
Mas foi como rapper que ele montou o primeiro grupo musical, ainda na adolescência, com alguns colegas de escola. O “Solução Rap” estreou na década de 1990 no Esporte Clube São Bernardo, mas, infelizmente, não teve uma boa recepção do público.
O disco em vinil é uma edição única do grupo Alquimistas, do qual Black foi integrante @Daniela Ferreira/Agência Mural
“Na minha primeira apresentação, fui vaiado”, conta rindo. “A gente não entendia o processo musical do rap, ainda estava sendo construído. O público ainda estava sendo formado, geralmente quem cantava também era parte da plateia”, lembra.
Para Alquimista, a aproximação com a arte foi fundamental para lidar com o racismo enfrentado ao longo da vida.
“Costumo falar para a minha esposa que se não fosse a arte, talvez eu teria acumulado muita coisa. A arte é o meu refúgio, o meu equilíbrio. A arte é um meio de libertação para as pessoas”, declara o produtor.
Fundação da Posse Hausa
O envolvimento de Black com o hip-hop o levou para além dos palcos. O artista também ajudou a fundar o coletivo Posse Hausa.
Criado em 26 de junho de 1993, surgiu em meio a encontros de jovens fãs de hip hop realizados em pistas de skate. Posse significa reunião de pessoas, enquanto Hausa é um dialeto africano falado por muitos dos africanos escravizados que participaram da Revolta dos Malês, em 1835, em Salvador, na Bahia.
Entre as atividades feitas pelo coletivo, uma das mais marcantes para Marcos foi a produção de folhetos contendo informações sobre personalidades importantes para a história negra. Os materiais eram distribuídos em eventos.
O documentarista presenteou todos os integrantes do filme com um pôster do curta @Daniela Ferreira/Agência Mural
“Esses panfletos rodaram o mundo e trouxeram reconhecimento para o nosso coletivo. Por causa deles, até a ONG Universal Zulu Nation entrou em contato conosco”, narra o MC.
Após anos de trabalho como MC e produtor musical, Black viu na aposentadoria, conquistada por tempo de trabalho, a oportunidade de retomar uma antiga paixão: o audiovisual. Entre os cursos que fez, o diretor foi aceito para estudar no CAV (Centro de Audiovisual) de São Bernardo do Campo.
“Sempre quis que as minhas músicas fizessem parte da trilha sonora de um filme”, confessa Black. “Além disso, como uma pessoa negra, não quero ter que esperar que o outro conte a nossa história”, pontua o cineasta.
Local: Casa da Palavra
Endereço: Praça do Carmo, 171 – Centro- Santo André
Horário de funcionamento: Dia 16/07 das 19h às 21h
Formas de pagamento: Gratuito
Local: Fábrica de Cultura Diadema
Endereço: Rua Vereador Gustavo Sonnewend Neto -135 – Centro- Diadema
Horário de funcionamento: Dia 26/07 das 16h às 18h
Formas de pagamento: Gratuito
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